chegando

Eu devia ter pedido o papel com meu nome escrito errado pra quem me recebeu no aeroporto. Do hotel escreveria nele uma carta. Mas esqueci. O aeroporto de São Luís estava com uma reforma no teto: BLAM- BLAM-BLAM! As apresentações foram feitas em voz mais alta que o normal. A professora Joanita e o Bruno, aluno dela e parte da organização do evento já estavam lá com o convidado argentino. Faltava um japonês. Esperamos então. Já passava de 1 da tarde e minha oficina começaria às 2. Daí eu iria direto pra lá, sem hotel e com as duas mochilas e um pouco de fome. Paciência (eu tenho é muito). Então vamo conversar, né? Acabou o desembarque e nada do convidado de nome japonês. As companhias aéreas não fornecem informações sobre passageiros, e agora? Vamo anunciar no som, aí BLAM BLAM BLAM, é não dá. Bom, como eu não era da organização avisei que ia fumar um cigarro lá fora, olhando o restim de chuva ludovicense. Ah, e não, não vou me perder estarei bem ali, ó. O argentino resolveu ir comigo, acho que mais pra sair do barulho lá de dentro. Aí tentei puxar papo.

– E o que isso aí? – Eu apontava pra uma bagagem retangular e aparentemente meio flexível, que ele trazia.

– ?!

– Isso. – o cara me olhou estranho. Quase ofendido.

– Minha roupa, ora. Porque?

– Ah… é um terno! – ele vai falar de terno num evento desses em São Luís, ok. – Pensei que fosse algum equipamento ou material que você ia mostrar.

– Não.

– Ok.

Fumei mais. Agora que já começamos…

– E você vai falar do que?

– TV Rocinha. Implantamos TV a cabo numa favela.

– Ah, legal. E como foi pra entrar na Rocinha?

– Como assim?

– Pra começar e dar certo, como vocês fizeram?

– Ah, colocamos *** de reais lá dentro!.. E as pessoas de lá é que trabalham lá também.

– Não, eu sei. Eu digo, com quem vocês falaram, com quem começaram a explicar a proposta… É preciso começar com algumas pessoas em qualquer lugar novo, quanto mais na Rocinha, não?

– Ah… com líderes comunitários. – e fez um gesto óbvio com a mão. A parte da conversa que eu acharia mais interessante morria ali. E nada do japonês. E chuva.

– E você, trabalha com que?

– Publicações independentes. Fanzines. Redes de comunicação.

– Ahn…

Aí ele começou a falar – depois que perguntei – sobre a história da família dele na Argentina e como foi rodar o mundo e parar no Rio. Legal e tal, aí o povo veio ainda preocupado com o outro convidado que sumiu. Será que ele dormiu e foi descer em Belém?

– Ér… ele vai falar agora à tarde? È que eu vou.

E fomos. No caminho, a parte sem graça da cidade, como todo em volta da maioria dos aeroportos. A professora me explicou como que se desculpando, mas tudo certo. Perguntei de que lado o sol nascia, mas ninguém sabia dizer. Mas me disseram o nome das rodovias, que são nacionalidades parte da história do lugar, achei massa.

– Qual a população de São Luís? – o argentino perguntou.

– Mais de 1 milhão de habitantes. Bem, existe uma briga com o IBGE, eles não reconhecem que já passamos disso, mas é isso. – a professora solícita tentava responder todas as perguntas de almanaque abril e gúgou que ele tinha quando eu exclamei e apontei com o dedo:

– Escoteiros do Mar?! – era uma casinha com cara de associação no meio dum terreno cheio de lama. Ainda longe da praia, supus.

– ?! Poxa, nunca tinha visto isso.

Aí o papo voltou a ser de comparar tamanhos de capitais, etc. Depois mudou pra turismo e foi falado sobre Fortaleza, sempre a frase chave de pessoas em trânsito, não importa de onde nem pra onde, o papo pode ser “Você já foi à _________?” aí o resto flui. Falamos do turismo ruim que estragou a Praia de Iracema aqui. Alguém completou, é, os estrangeiros tomaram conta de tudo, compram tudo, os franceses, os holandeses, os… aí ele interveio.

– Mas veja, Santa Catarina foi o único estado do Brasil cujo PIB (ou outro nome pra lucro, não lembro) aumentou em *** por cento (também não guardo números).

– Hunm..

– E sabe porque?

– As chuvas? – minha resposta foi sincera.

– Ah!…. não dá pra falar sério com você!

E ele nem me cumprimentou no café da manhã seguinte.

Uma resposta to “chegando”

  1. Suellen Says:

    Poxa Fernanda, tu podia ter me perguntado.
    O Sol… nasce na janela do meu quarto!

    [Conhatrac é relativamente perto do aeroporto.]

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